terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

"A Crise da Educação no Brasil não é uma Crise, é um Projeto" (2)

(3) Mudanças Impostas pelo Governo Marchezan na educação Municipal de Porto Alegre

Sou professora da Rede Estadual em Canoas, ou seja, não trabalho na rede municipal de Porto Alegre. Mas o ataque desferido àquela rede de ensino não pode ser vista de forma separada do resto. Se no governo federal há a imposição de uma reforma no ensino médio; no estado do RS há uma reforma no ensino fundamental, redução de turmas (inchamento de turmas), enturmação, redução da hora atividade, não cumprimento da hora-atividade para educadores e educadoras de anos iniciais; no governo municipal de PoA faz parte deste projeto de crise na educação.

Como disse, não faço parte da rede municipal e por isso me basearei em quem faz:

 Professora de Anos iniciais, pedagoga formada pela UFRGS:

"A rede municipal de Porto Alegre, para quem não sabe, atende a população mais carente da cidade, por estar localizada nas regiões mais periféricas. Sou oriunda da rede estadual e tenho exato um ano de magistério municipal.... Muitos colegas vêem a localização geográfica das escolas municipais como um elemento de demérito e alguns chegam a conclusão que mesmo com a remuneração superior ao estado "não vale a pena", pelos "riscos e incômodo". Pois posso dizer para vocês que no município pude ressignificar minha docência, não porque no Estado já não acreditasse que somente lutando é que poderia ser professora, mas sim porque a rede municipal conta com uma trajetória ainda viva de projeto educacional democrático e também porque conta com uma dignidade maior expressa na condição de trabalho e remuneração. Pois horas de trabalho e remuneração são sim condições fundamentais para a prática educacional de qualidade, não acredito em "aptidão natural" e sei que nossa profissão tem como parte de seu arcabouço teórico muito desse imaginário, quase como se ser professor fosse um "dom natural". Não o é, e estuda-se muito para que possa se alcançar um aprendizado significativo para milhares de estudantes da rede.
A mudança na rotina escolar proposta pelo exc. Prefeito é embasada em projetos já em curso em nosso país, um escola que mais se assemelhará a uma fábrica. Produção em massa, sem tempo para reflexão e projetos que construam a autonomia. Demanda-se tempo para transpor as barreiras impostas pela sociedade desigual que vivemos e que é expressa em muitos de nossos educandos! Demanda-se qualidade de vida para compreender o desafio diário que enfrenta uma escola que em muitas comunidade é o única braço do Estado, depois do braço armado sempre presente na vida de nossos estudantes, muitas vezes para aterrorizar e punir a pobreza do qual esta comunidade mesmo é vítima.
Para sair da posição de vítimas pela retirada cotidiana de direitos, para se enxergar enquanto sujeitos de direitos, não bastam cartilhas, não bastam as refeições diárias (ainda que muito importantes), é preciso abrir espaço para a aprendizagem, é preciso espaço para a construção da "contra-lógica". Ensinar estudantes da periferia, meninos e meninas, em sua maioria negras e negros que são sim portadores de conhecimentos e parte do mundo que assistem pela televisão demanda educadores com tempo para refletir essa contra-lógica, amorosidade para construir e paciência para resistir. A mudança anti-democrática nas escolas do município de Porto Alegre é parte de uma lógica de retiradas de direitos que está em curso em nosso país...



* Imagem criada por uma escola da rede municipal que explica as mudanças

Em resumo, mais uma vez somos nós os professores os responsabilizados - até porque serão professores  e equipes diretivas que terão que responder pelos alunos que ficarão sozinhos por um grande período do tempo - por terem como argumento que "a reforma aumenta o tempo dos alunos com os professores" como se isso aumentasse a qualidade das aulas. Se não tiver estrutura, planejamento e respeito pela comunidade escolar, como que a educação terá qualidade?

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